quinta-feira, 15 de setembro de 2016

elviras-pagãs-cristãs

elvira pagã

é de kierkegaard a expressão: que desgraça ser mulher! e quando se é mulher, sem dúvida, a pior desgraça, no fundo, é não compreender o que é ser uma desgraça.

a formulação que abre a obra, o estigma do passivo sexual, de michel misse, foi retirada de o segundo sexo de simone de beuvoir e não esconde referência ao estigma. até o reforça, o nomeia. quem entretanto se atreveria a falar seriamente “ no estigma de ser mulher”, também referenciado, nomeado e reforçado, por exemplo, na música popular brasileira — como em tantos outros setores – pelo partideiro martinho da vila em seu “ você não passa de uma mulher” ou no clássico de ataulfo, amélia ? (letra de mário lago, histórico comunista).

mulheres assassinadas seria um título gongórico. de efeitos culátricos e camufladores. de indisfarçável equívoco ideológico quanto a nossa proposta de alçar a questão do cotidiano, para além do marchetar jornalístico, situando os diversos enfrentamentos da mulher no seu existir, a partir dos recentes assassinatos de mulheres mineiras por maridos machos “desonrados”. que como tantos outros se incorporam a manutenção do status quo nacional, onde o assasssinato corporificado camufla o assassinato simbólico — crudelíssimo socialmente.

mulheres assassinadas é um título de efeito, levanta, sem dúvida, o clamor sobre o crime. mas o paroxismo da adjetivação é contraditoriamente um eufemismo que reconhece a barbaridade do fato, entretanto ignora conscientemente e assenta cada vez mais no substractum social, a falácia da questão da honra ferida do macho-fascista, colaborando no assentimento da necessidade, sempre imperiosa, de lavar a honra(do macho).

não é de estranhar que o judiciário registre tantos casos de absolvições aos machos justiceiros. doca street foi bastante retaliado pela imprensa à luz econômica, válida. mas é um entre milhares de casos anônimos. isto não é surpresa. a imprensa é macha, o judiciário, um corpo de machos, desnecessário dizer que o fio que faz erigir nossa conduta social é machista, manifesta no princípio de uma espinha dorsal edificada a partir de um patriarcalismo fundado em razões ascéticas burguesas mistas a remanejáveis tradições judaico-cristãs.
nossas elviras, mesmo quando pagãs, o são cristãs. isso desde a destruição da proto-sociedade que era matriarcal.
diante das evidências científicas e diversas obras de antropólogos e sexólogos “machos” não há mais como negá-lo. a mulher vem paulatinamente, implacavelmente, incorporando seu estigma. mesmo quando dos diversos movimentos libertários, tal como os das sufragettes, rebelam-se, incorporaram mais fortemente seu estigma porque suas resultantes fazem-se notar num femininismo equivocado — porque referenciado em valôres machos- e, assim sendo, não é uma conquista, onde muitas se esguelam, assinando depois a capitulação em torno daquilo que combatem.

a noção de casamento indissolúvel também é outro componente macho. a relação sexual duradoura é que é a questão. quando se tem de admitir que o casamento nao é uma instituição inata ou sobrenatural  e sim uma simples instituição social, de imediato levantam-se vozes— mesmo de tendencias pagãs-cristãs- tentando provar que a humanidade sempre viveu na monogamia. chegando-se ao ponto de falsificar a etnologia para concluir que a instituição casamento é indispensável para à existência da sociedade humana, da cultura, da civilização, renunciando-o a qualquer possibilidade de examinar o substrato econômico-social das formas sexuais e de suas variações no tempo e no espaço. isso todavia foi feito por pensadores do porte de engels, em a origem da família, da propriedade privada e dos estado, pelas análises do expurgado de direita-esquerda reich – no brasil por oswald de andrade – mas evidentemente varridos de nossa cultura pelo domínio hegemônico de uma má política. antes mesmo destes, fourier, socialista utópico na obra(só agora revelada) o novo mundo amoroso, escrita em 1816/18, antes de sthendal, sobre o amor, em 1822, pregava a política harmônica do ato de amar que foi deturpada e envolta em mistérios que pululam do silêncio mortal a exclamações estupefatas das repetições que sempre envolvem as questões libertárias do sexo, profundamente permeadas de política e vice-versa, pois não existe libertação sexual sem libertação política, o que implica não só na derrubada do sistema moral do capitalismo bem como de sua própria ordem.

a concepção contemporânea do casamento, seus códigos de honra, é ainda em larga escala a dos evangelhos, tal como o desenvolveram canonistas da idade media. e até o sec.XVI a igreja lecionou sozinha, para depois viver em regime de concubinato com o estado.
a verdade, porém, é algo bem mais percuciente. e quando razões materiais existem, a intocabilidade de certas questões vai pras cucuias, pois a sociedade modifica a ideologia – mas sempre na visao do macho – como por exemplo quando a população da europa central foi dizimada pela guerra dos 30 anos, igreja e estado apressaram-se com a dieta de nuremberg (14 de fevereiro de 1650) promulgando um decreto que abolia a monogamia, espaldando a bigamia durante dez anos. se isso ainda não for suficente, qualquer viagem turística ao oriente serve para mostrar a condição da mulher e que a monogamia é mais um blefe do tipo autoritário-cristão.

a luta pela liberdade da mulher dispor do direito das dimensões políticas do uso do seu corpo tem gerado muitos equívocos. a mulher-objeto não existe, existe nas caricaturas do macho-fascista que incapaz de auto-valer-se da dialética do prazer fragmenta o mundo em rótulos de existência conceitual bastante efetivos para sua condição castrante, manipulando o instrumento objeto-mulher como organismo massacrado à sua exploração.

enquanto persistir uma luta de libertação da mulher exclusivamente restrita à questão sexual, a morte de “adúlteras” diante da consciência política falsa, será constante entre os espaços-machos verificáveis entre a legalidade e a legitimidade.

enfim, a memoria não só das mulheres recém massacradas de fato, mulheres mineiras no seio da anquilosada tradicional-sociedade-mineira, que se orgulha de assassinar para lavar a honra; às mulheres proletárias assassinadas sem nenhum simbolismo e também aquela que foi uma tentativa ao nivel empirico-imediatista de equacionar a questão feminina no aspecto de libertação aos padrões estereotipados, profundamente mais cruéis para as “cidadãs de segunda-classe”, sucumbindo vítimas de seu próprio primitivismo, num genocídio bem evidenciado – bem como nos demais atos de justiça da honra – que mostram a pequenez da condição humana quando referenciados no machismo, no matriarcado.

a elvira, estas questões, que entreolham-se ante a total escassez a que foi reduzida a condição feminina.

“ quem sabe ó mãe, o super-homem venha nos restituir a glória só por causa da mulher "

publicado na terça.feira 9 de setembro de 1980 na página de opinião do diário de pernambuco, “ o jornal mais antigo em circulação na américa latrina”.

8.513.000 km²

basta a cada dia, sua pena. mateus.

gente é pra brilhar e não pra morrer de fome. caetano veloso.

e praza a deus que o triste e duro fado de tamanho desastre se contente; que sempre um grande mal inopinado é mais do que espera a incauta gente. camões, écloga.



secretário de segurança, luiz bronzeado



8.513.000 km2. aprendi que é esta a extensão terr(a)itorial do brasil. aprendi também que nosso país é um dos maiores do mundo e que aqui, se plantando tudo dá. graças as benesses da mãe natureza. tudo isso incutido no nacionalismo xenófobo que nos é pasteurizado desde a primária educação ideológica.

primária, porém eficiente, que destrambelha o raciocínio de tantos da raça tupiniquim, que bem poderiam ser outros que não dedos-duro, pró-castradores e assassinos de bom soldo. cerqueira leite o disse muito bem, quando registrou que, no brasil, o entreguismo já foi oficializado. bom dia entreguistas! nos encontraremos logo mais no inferno, diria cocteau.

recrudesce a violência em alagamar e similares. sim, similares, porque de cabo a rabo deste país, as questões agrárias imprensam cornos de governantes e ventre dos rurais contra o arame farpado que é desmantelar a herança latifundiária dessa colônia. colônia novamente, quando a preço de banana, multinacionais já vão com um terço da amazônia, pará e mato grosso(os dois) no colete do, ainda legítimo brins ingleses? com os quais se manifesta nossa diplomacia.

nada mais sagrado para o homem do que a terra. por que a terra significa a sobrevivência do corpo e do espírito. para além da reificação da paternidade maior do barro, o sal da terra traz no ventre o ciclo final do seu mesmo cio. a terra é essencial tanto para que brote a vida, como para que nela se recolha a morte, qualquer que seja a crença de transmigração de almas. da terra pois precisa o homem para viver e morrer. e por causa dela ainda continuam morrendo de susto, bala ou vício.

morte física e espirititual e o que é pior: pela morte torturante da pressão avassaladora, de doer os olhos no latifúndio que empestilenta a terra com gérmens de uma criação pária ou a estereliza impedindo sua ocupação para dar de comer a quem tem fome.

mas a violência explode física, espiritualmente e também intelectualmente longe-perto dos homens que não tem o cheiro do sêmem da terra nas mãos. esses pruridos intelectuais são a covardia disseminada numa safra de homens que, sem calos nas mãos de enxada, ou outra arma qualquer, que não seja o eufemismo da pena jornalística, tão comprometidos com o pesos dos tempos, se envergam se engasgam e findam tuberculosos numa repartição pública.

falando da violência intelectual, nada mais violento do que o modo de justificativa grotesco do poder, quando está encalacrado, apesar de todas as falcatruas que são facultadas para a mimese e é suplantado pela realidade, que explode num rastro de sangue que mancha sua casimira santa ou no ar estupefato e moribundo de uma família que não entende o mecanismo do gás lacrimogênio quando ela já tem tanto porque chorar.

o senhor secretário de segurança pública é um atentado à mediocridade que se preze. repete a toda hora que a paraíba é “ um mar de tranquilidade “ (talvez fosse, sem ele!) descamba para o inverossímil, atribuindo a onda de violência que assola a sociedade brasileira e paraibana a medusa televisiva.

entretanto, a tirada maior antes as ações despropositadas de violência em alagamar é o desfraldar da bandeira tê-efe-tepista, confissão indisfarçável de sua falta de tato e habilidade para com ações e microfones, atribuindo como moto da igreja, o marximismo-leninismo, rumo a américa latina. decididamente só mesmo o diletantismo chinfrim permite alguém ir de “ le petit principe” a marx e lenine com tanta audácia, ignorando variáveis diretas e indiretas.

disse o senhor secretário, que as ideologias estrangeiras devem ficar lá fora, pois as questões daqui devem ser resolvidas com uma ideologia nacionalista. mas, desde quando, o feudismo, o latifundarismo, o capitalismo, são ideologias autóctones ? antes fosse o caso, para puxar a clava do equilíbrio, elemento democrático ?

continuando a semana o articulista abelardo jurema esta semana fez o apanágio do senhor governador, afirmando que ele vem se firmando a cada dia que passa. eu já acho que, com o staff que ele tem, que mais parece uma centopeia baleada(tanto é que as reformas estão aí no secretariado) se ele não se cuida acabam lhe aprontando uma cama de gato.

falando nisso, outra gafe da semana, muito bem aproveitada por d.josé maria pires, que vem se revelando articulista de verve insuperável ante as treslouquices do poder, fosse a hora de aplauso e não de correrias, foi cometida pelo senhor secretário de comunicação social o senhor carlos roberto, no melhor estilo diplomacia de tamborete, com sua nota publicada com o fito de resfriamento do causo em pauta, tentou interromper as ebulições de alagamar, procurando salvar a barra de seu patrão maior, dirigindo a opinião pública aos caminhos do bem senso e do sentido prático da realidade. ensaiava ainda que o senhor burity já havia tomado todas as medidas ao seu alcance para resolver a questão, questão difícil de ser resolvida de uma hora para outra. tanto não foi assim que o governador virou notícia no sul do país( e só assim a paraíba tem virado notícia) acorrendo do seu posto que é governar(elaborar programas e fazê-los cumprir, e não ir pessoalmente cumprir)(imagine a capa que isso daria pra o pasquim e o enfim)(mais uma vez provado nosso sub-desenvolvimento).
d.pelé (josé maria pires)

contra argumento há fatos. o menor bom senso não jogaria bombas de gás em colonos depauperados e seus familiares. bombas de gás é coisa pras cidades em tempos de 68 ô da polícia! se era pra fazer o serviço, o bom senso, se vocês tivessem, teria indicado outros métodos, mais eficazes e muito menos espalhafatosos.

entretanto, eu sou um conciliador. quero acreditar no bom senso e no sentido prático da realidade, somando a isso a natureza pura da matemática com sua filosofia. 8.513.000km2, é terra pra cacete. não há necessidade de massacres para fazer render a terra(em quantidade de distribuição tão apertada para tantos colonos). se continua esta política, vai haver muita terra pros colonos em cima, quando eles estiverem todos enterrados em baixo.

é este o bom senso da justiça? apenas sete palmos de terra? dada após espremida ?

texto integral publicado na página editorial de o norte, na segunda 07 de janeiro de 1980, urdido naquelas tardes de domingo, na praia da redação, vestindo calção de secretário do jornal, sem salva vidas, em meio aos tubarões que, na mesma segunda, cortariam minha cabeça. ainda assim como a gente se divertia dando bunda canastra em meio as baionetas do poder embriagados que estávamos pela cachaça do jornalismo combatente.

http://memorialdademocracia.com.br/card/povo-de-alagamar-conquista-terras

carrascos de si mesmos *

anos mais tarde a câmara municpal de joão pessoa condecora o fausto com a comenda poeta ronaldo cunha lima e o título de cidadão pessoense. eles se merecem.



sou homem. não julgo alheio de mim nada do que é humano. terêncio, 190-150 ac.

prólogo – o que é mais importante para a construção de uma sociedade estável ? a sexualidade de um homem ou sua coerência política ? caráter e princípios ou sua preferência sexual ?

questões profundas. oscar wilde tinha uma triste, belíssima e contudente razão no de profundis, escrito nas celas da prisão, condenado que foi, na inglaterra dos lordes e sirs, pelo “crime” de afrontar a hipocrisia e viver sua homossexualidade.

alguns vereadores da câmara municipal de joão pessoa confirmaram tais questões. com virulenta, sórdida e ignominiosa escrita.

ato I – ricardo coutinho, vereador do pt, apresentou requerimento “as captandun minorias” por uma moção de solidariedade. não aos negros, nordestinos ou as mulheres mas aos homossexuais.

foi o bastante para que o congênere genivaldo fausto, do pfl, colocar fogo nos lençóis e mostrar que câmara não é cama. e, se fosse, seria de macho. e bota macho nisso. eu disse macho ? leia-se baixo.

o que poderia ser vetado ou apoiado de acordo com suas convicções, senão com a elegância que se espera de homens públicos – nós eleitores desejamos isso mais do que qualquer desejo em nossa peregrinação por homens de verdade – transformou-se num grotesco espetáculo de alto-nível-baixo, destacado, distorcido, mas não aprofundado pela imprensa.

ricardo, entusiasmado, bem intencionado ou não, vislumbrou a oportunidade de levar a luta do pt em outras frentes, a sexual, terreno minado pelo preconceito e estigmatização, esquecendo-se, no caso, antes e depois, talvez pela míopia política que costuma se abater sobre os próprios, que o grande problema de ser gay – termo julgado politicamente incorreto pelos próprios – é sua condição econômica, o problema de qualquer minoria, o que revela um paradoxo da democracia: a soma das partes é bem menor que o todo. e neste regime as minorias não tem vez. não que eu seja antidemocrático, dos males o menor. mas joão pessoa não é amsterdã, são francisco. onde os homossexuais tem efetivas forças de representação – a luta não para apesar de inúmeras conquistas – e não vivem em guetos. tem restaurantes, farmacias, academias, clínicas, etc, não como esconderijo, mas sim como mostruário da sua importância como segmento economicamente significativo a ponto de existirem produtos e campanhas publicitárias –até de automóveis – específicas para os homossexuais.


ricardo, continua solidário hoje ?


a questão é complexa cultural,sócio antropologicamente e economicamente falando. mas daí a cair na chacota e na baixaria, nos leva dolorosamente a refletir sobre a opção preferencial e cível de quem nos representa na câmara. se fazem isso publicamente, é de se imaginar o que não fazem em grupelhos, em suas casas, e com suas famílias.

ato II - genival que não é nada fausto em suas argumentações, vislumbrou fantasmas freud-reichianos nas intenções e nos andares dos vereadores que disseram sim à moção. segurou os culhões e partiu contra. com aquela desenvoltura que só os machos de sua espécie sabem ter: a da baixaria, da insinuação jocosa, da difamação, do perjúrio. bombardeou a moção com o arrasto dos vereadores à condição de homens de macheza duvidosa, como se isto fosse condição à priori para qualificar o requerimento.

o comportamento truculento de genival fausto, como bem mostram enquetes sociológicas e perfis psicológicos é frequente em machos típicos que à noite buscam travestis não emasculados para equacionar sua dicotomia entre a fascinação de dominar e ser dominado em jogos pra muito além da câmara. como se não bastasse, gabou-se de “ partes grandes “. rogéria, garantem os íntimos, é um desperdício . e isso não mudou sua alma feminina. dolmancé, personagem de sade- a vida imita a arte – tinha 25 centímetros por oito de diâmetro, e era um passivo insaciável. assim, vale não o tamanho da vara. e sim a mágica que ela faz, garantem os andrologistas.

genival poderia discordar. até veementemente, de acordo com seus princípios existencias. mas tem a obrigação de respeitar o primado político das posições dessemelhantes entre os iguais. mas qual o quê. o homem é macho. e macho é assim mesmo, ou não é ?

ato III – se causa espanto ? a reação de genivaldo fausto, o que dizer do vereador marco antônio, que quis pretenciosamente substituir robert redford – sem o milhão de dólares – com uma proposta indecente, respondendo na mesma moeda ideológica do opositor – a da baxaria e do desrespeito ao mínimo senso de decência em nome do qual arvoram-se – marco antônio bem que poderia ser o romano mas não. enveredou, imberbe, pela posição muito macho, concitando, a quem duvida de tal macheza, a emprestar-lhe suas mulheres para ouvir após noite dormida seus depoimentos insuspeitos sobre sua gaboleada condição(deveria então dormir com o genivaldo). ejaculação precoce, marco antônio. homossexuais fazem muito sucesso entre as mulheres, talvez porque não tão afoitos, respeitam o tempo feminino, proporcionando-lhes orgasmos múltiplos, coisa que mulher de muito macho não desconfia de ser possível.

epílogo – do restante das argumentações, até a do sou casado, como se homossexuais não casassem(inter e intra matrimônios) salvou-se a posição de trocolli júnior, menos truculenta, escorado no humor, pelo menos no episódio, porque se não verticalizou a questão, não baixou ainda mais o nível.

da peça fica – não a temática da qual se aproveitam oportunistas para perpetuar ainda mais a ignorância, o preconceito, a dominância, de um povo perdido nesta fase suja – como políticos, numa fase tão miseravelmente degradante da vida política do pais – e do estado – se prestam para tais papéis ? talvez porque são políticos mesmo precisando de um voto de solidariedade principalmente nas urnas, que logo estarão abertas a uma minoria – que não interessa sua preferência sexual. é melhor um homossexual feliz, do que um desencontrado a cometer estupros e sexídios, com adultos e crianças – minoria esta que saiba honrar o voto do eleitor que espera que tais vereadores compareçam a câmara para quebrar, isto sim, a imensa cadeia de preconceito contra a honestidade, a inteligência, a determinação em lutar contra o descalabro em que está mergulhada a sociedade brasileira, sem opção alguma, senão a de assistir a este triste espetáculo.

carrascos de outrem. carrascos de sí mesmos, estes vereadores.
eu não sou. mas quem não é ?
ecoa na câmara de vereadores de joão pessoa o fantasma da sexualidade de profundis.


*publicado no correio da paraiba, em 22 de junho de 1993, sob a rubrica crítica de cultura e idéias. texto integral, conforme original, salvo correções de erros cacográficos.

ricardo coutinho é hoje governador(em 2010, foi eleito governador pelo psb) e ex-prefeito de prefeito de joão pessoa pelo pt. genivaldo, não sabemos se teve carreira fausta ou se marco antônio foi para holiúdi.

o presente texto, conforme mapa editorial, inicia uma série entitulada “unhas e dentes”, que posteriormente será publicada como livro, juntamente com textos jornalísticos atuais. os textos trazem a marca do jornalismo de intervenção num tempo em que cabeça de jornalista tinha como cotonete baioneta. seja pela pressão da ditadura. seja pela pressão do coronelismo de asfalto que ainda hoje faz vítimas nordeste afora.

incidente no gulliver. manchete à sua altura ?

 o pretenso bardo da democracia não passa de um reverso


a honra, é objetivamente, a opinião dos outros acerca do nosso valor e, subjetivamente, o nosso medo desta opinião. schopenhauer.

como se suja o homem que lava a honra em sangue. mário da silva brito.

as pessoas decentes não precisam de honra. solfocleto.


sexta-feira fatídica, marcada por uma tentativa de assassinato.
sábado malévolo, marcado pela consumação de outro. arma ? manchete de a união: incidente leva ronaldo a se licenciar do cargo.

de quantas maneiras se pode mesmo matar um homem ? a frase é de brecht, com quem aprendi também o conceito de verfrendung (distanciamento) que fora do jogo teatral acompanha-me no jogo da vida e da morte. e a ela recorro, quase à exaustão, para cindir o óbvio e o obtuso, sem pistola, apenas com as armas do intelecto, ofício praticado em tom blasé.

sob prisma sociológico-semiológico, manchete e gulliver, permitem interpretação marxista-barthesiana- mitologias- sobre modos dialéticos descritos fabulosamente por swift, nas sagas do viajante ante as grandezas e pequenezas humanas, nem sempre correspondentes a altura, tese e antítese, ânsia infernal de síntese cuja sede embriaga. não vou derivar a tanto. salve-se quem puder, porque hoje, o alvo é outro.

pois bem. de dar tiro- e levar – ninguém está livre. ó tempo! ó costumes! por isso o franco atirador não vai acionar sua metralhadora giratória sobre o fato dissecado – e de forma bem plural – por evandro nóbrega, carlos roberto de oliveira e arthur gadelha. mas o estrondo da manchete ainda ribomba nos ouvidos de quem tem vergonha na cara e mínimo critério profissional que não esteja comprometido com o couvert do gulliver. tentativa de assassinato é tentativa de assassinato. não importam os motivos. e quando um jornal transforma isso em incidente (sic) “eufemismo hiperbolizado”,  alicerçado por editorial marrom que ocupa 2/3 de página em defesa da honra, não dá pra calar. porque calar é compactuar com este tipo de achatamento do caráter e da dignidade esculpido por quem tanto defende a honra. aliás, a defesa da honra é tiro pela culatra, recurso torpe, sempre ligado ao mais traiçoeiros, hediondos e bárbaros crimes. nenhum foca esclarecido o invocaria, portanto. mas ronaldo, sempre teve uma horda de assessores e cavaleiros errantes, que sob o prisma de gulliver, são gigantes na gula e anões na inteligência e no caráter. isso até na hora de concatenar a estratégia do megarensiun lachrymae, pós-concebida para abafar acenos do atirador insano ?

por estas e outras é imperativo acabar com o foro privilegiado e não só 


da manchete ao editorial, passando pelos artigos de djacy andrade e nelson coelho, tivemos uma saraivada de estampidos que agridem o mais parco intelecto – como se já não bastassem tantos motivos para atrofiá-lo – e a mais tosca sensibilidade, diante do sarrabulho – a horda gosta de mesas fartas – cujo tempero é típico de escribas deluzidos. em nome da honra pessoal escreveu-se, à soldo barato, a lição do cala boca, para que fatos iguais não se repitam (ameaça do editorial), repetido no artigo de djacy andrade, que ainda corrobora a praticidade de bala para lavar a honra da família(que estes senhores devem ter muito frágeis a ponto de precisar de revólver para defendê-la). aliás, cássio já é um meninão bem crescidinho. ele mesmo deve defender-se, resolver-se, pois já tem carteira de habilitação para isso, menos para dar tiros, por favor, que já basta um atirador desastrado na família.

este não é o raciocínio de nelson coelho que esgarçou sub-conscientes, pois pra sí “ o chefe de família é o líder, o comandante, o ídolo, e o espelho, cujos reflexos acompanham a vida dos filhos pela existência inteira”.

pessoalmente, lamento pelos filhos de quem fez/permitiu tal manchete, tal editorial, tais tiros, e que destinos mais benfazejos venham a quebrar tais espelhos provocando a libertação biológica de tais imagens.

completando o trágico fim-de-semana – o que os teus fazem de tí pequenina – a coluna informe, no correio, em gorjeta (não se pode chamar aquilo de nota) aceita por espírito de corpo camaleão, registrava que o superintendente nonato guedes e o editor fernando moura viveram na noite de sexta uma das missões mais difícéis de cada um. este é o discurso típico de homens acovardados que trocam a consciência profissional pelo valor das prestações que não podem pagar, apegando as suas bundas a cargos mantidos para além da força da gravidade. quem tem realmente consciência das implicações do acontecido, limpa as gavetas, publica o fato e vai embora. se voltar terá conquistado o respeito dos amigos e inimigos. não foi o caso. e vamos para o “lá veritá”, fazer um mea culpa que não se priva dos acepipes. foi este o fim-de-noite dos desesperados ?

para quem não sabe a união foi o primeiro jornal onde pus os pés na paraiba. tempos em que o máximo que queríamos (rênio, sílvio osias, formiga) era um milk-shake na lanchonete do bompreço da joão machado. durou pouco, uma semana? gonzaga rodrigues, proposta de agnaldo almeida, hesitava em me ver na chefia de reportagem. eu, queria a secretaria de redação, ocupada por arlindo almeida. gonzaga não topou. um dos seus acertos. sem piadas.

pessoalmente, vinha acompanhando o trabalho de nonato frente a união. inegavelmente, vinha melhorando. sumiram as excessivas menções ao nome do governador na primeira página. princípios de segmentação e esboçados em novas colunas entregues a colunistas polêmicos. a diagramação ainda claudicante não comprometia. faltava mexer no colunismo social social que pecava por ter duas colunas: uma com excessos. outra, com faltas. só a propaganda do produto continuava uma merda. o saldo geral era bom para a excrescência que é um jornal do estado. mas, já que existe, não tinha porque ser puxa-saco, pouco inteligente. devia ser profissional, principalmente no caso da atual administração que tem uma das piores comunicações governamentais que se conhece. só que a união, infelizmente, ou felizmente, não resistiu a três tiros. e estampou em sua fachada centenária seu atestado de óbito enquanto jornal que não preza a acribiologia. a mesma cerimônia velamos quem isto permitiu, apesar de continuar vivos e bem dispostos a cometer, tantas vezes quanto forem necessárias, assassinato da postura profissional em nome de um “ certo profissionalismo” que se enebria em over-doses.

o episódio ressucitou balzac: “ essa bonomia aparente que seduz os recém-chegados e não pede traição alguma, que se permite e justifica tudo, que se queixa em voz alta de uma ferida e a perdoa, é um dos caracteres distintivos do jornalista. essa “camaradagem” corrói as mais belas almas, enferruja-lhes o orgulho e mata o princípio das grandes obras consagrando a covardia do espírito “. isso vale para marcos tavares, pelo segundo tiro.

devo ter autoridade para escrever o que escrevo. 1980. o norte. bombas de gás lacrimogênio em punhado de camponeses e crianças. governo burity. secretário de comunicação social social, carlos roberto. secretário de segurança, luís bronzeado. carlos roberto traz a nota do governo, clamando pelo bom senso. não pestanejei. publiquei a nota do governo e o 8.513.000km2, artigo anti-latifúndio, anti-governista, sem tréguas. o day-after foi uma reunião de cúpula com o secretário de segurança, mais alvejado – e nem por isso me deu ou mandou dar um tiro – para no fim da tarde marconi góes anunciar minha “substituição”. fiquei quites com minha consciência. o jornal com seus interesses (faz parte do jogo). e cada um na sua. mas teve ainda quem atribuísse ao combate sexual da juventude, publicado no quem-me-quer, na melhor estética gabeira da época, escrito uma semana antes, a causa possível da minha demissão. coisas do espírito de corpo às avessas. acontece. existem muitos luízes otávios por aí.

o tempo passou. eu continuo de bem comigo mesmo. como diz shaw, “ quem não for um revolucionário ao vinte, certamente será um canalha aos quarenta “. estou nos estertores dos trinta. posso ler e adaptar casti: “ il piacere di azzar la testa tutto l ´anno é ben pagato da certi quarti d´ora che bisogna passar “( o prazer de levar a cabeça levantada durante todo o ano é bem pago com alguns quartos de hora que é precis passar) fora das "sextas da adega “.(quem paga minhas contas sou eu, não o contribuinte).

vão atirar em mim também ? com certeza. de quantas maneiras se pode mesmo matar – ou tentar – um homem ?
pelas páginas de a união burity saberá dizê-lo ?

(texto integral publicado em o norte, associado da paraíba, em 11 de novembro de 1993).

(gulliver, durante algum tempo, restaurante da moda frequentado por políticos e classe-dominante-sem-classe- da paraíba. adega do alfredo, idem.
no gulliver o então governador da paraíba, poetastro ronaldo cunha lima, disparou três tiros em tarcísio burity ex-governador do estado;em nome da defesa do filho, cassio cunha lima, que mais tarde viria também a ser governador, confirmando a desonra de um grupo que isquemizou o estado durante anos e anos(ficha suja em 2010). o acontecido deu-se por supostas ofensas feitas por burity em entrevista dada a rádio local. ronaldo, disse que agiu, antes de tudo como pai, em defesa de um filho já sufragado.

tarcisio sobreviveu e antes de morrer perdoaria a ronaldo cunha lima, que naquele ano seria galardoado com o prêmio de melhor poeta do estado. cunha lima nunca foi a julgamento acobertado pelo corporativismo de um senado, elegeu-se senador – e de uma câmara – que nunca deixaram de feder, como se vê até hoje.

na época, diretor de criação associado do grupo criativo de atendimento em propaganda e marketing – GCA –, agência que batizei e fundei na paraíba, disparei o artigo que provocou erizipela nos sócios preocupados com a empresa, de olho grande que estavam nas contas do governo, dominado pelos tentáculos do grupo ligado aos cunha lima.

pensei cá comigo, pensei à época— mas que diabos! ou se é publicitário ou um rato, se bem que hoje tá quase tudo a mesma coisa.
e ratazana é que não sou. falava e ainda mais alto o jornalista e o cidadão indignado.